O Escritor Fantasma

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Sinopse

O ex-primeiro ministro britânico deseja escrever suas memórias. Um escritor de sucesso aceita a missão de funcionar como ghostwriter. Todavia, à medida que avança nas histórias, o autor percebe que há verdades ocultas.

Crítica

O título em português pode fazer o espectador mais desavisado pensar que O Escritor Fantasma, de Roman Polanski, não passa de um thriller sobrenatural. Mas não se deixe enganar. Como não temos no Brasil um equivalente à expressão inglesa ghostwriter (dublê de escrita? escritor de aluguel?), a tradução literal foi utilizada pela distribuidora nacional. Passando por cima deste título, o espectador encontrará um Roman Polanski em plena forma, engendrando uma trama de suspense digna de seus filmes mais clássicos.

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Baseado no livro de Robert Harris, com roteiro do próprio autor ao lado de PolanskiO Escritor Fantasma acompanha a trajetória de um ghostwriter (Ewan McGregor) que é contratado a peso de ouro para escrever as memórias do controverso ex-primeiro-ministro da Inglaterra, Adam Lang (Pierce Brosnan). O antigo titular da cadeira, o assessor do político, Mike McAra, teria cometido suicídio – o que não deixa o novo contratado nada confortável com a tarefa. Para piorar, o “escritor fantasma” é obrigado a viajar aos Estados Unidos, onde Lang está morando junto de sua esposa, Ruth (Olivia Williams), e de sua equipe, capitaneada por Amelia (Kim Cattral).

O tempo que o ghostwriter tem para terminar o livro é exíguo, mas como Mike já havia realizado um trabalho extenso de 600 páginas, não parecia um desafio que ele não pudesse terminar. O problema é que o acesso ao manuscrito de McAra é muito restrito e Lang acaba se mostrando um sujeito pouco acessível para entrevistas. O maior empecilho é o fato de o político estar envolvido em uma investigação que o tem como principal suspeito de ser conivente com crimes de guerra. Contratado apenas para escrever as memórias de Lang, o “fantasma” se vê cada vez mais envolto nos mistérios a cerca de seu novo patrão e começa a investigar a fundo as questões que o instigam.

Muito pode-se especular sobre a conduta controversa de Roman Polanski em sua vida privada. Mas é incontestável que o cineasta franco-polonês tem um talento todo especial como contador de histórias. Principalmente quando a trama necessita de um clima de suspense palpável (como já havia feito magistralmente em O Bebê de Rosemary em 1968). Em O Escritor Fantasma, Polanski tece sua trama sem pressa alguma e vai envolvendo o espectador a cada novo desenrolar dos fatos. A narrativa é lenta, mas nunca se torna maçante. O diretor dá tempo ao tempo e nos vai revelando a cada novo frame uma informação inédita, seja sobre o grande mistério da história, seja sobre a conduta de personagens que estamos acompanhando. É um verdadeiro prazer observar o trabalho de Polanski ao orquestrar esta obra de mistério.

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Ajuda o fato de o elenco ser escolhido a dedo e contar com um Ewan McGregor inspiradíssimo como o protagonista sem nome. Com um senso de humor britânico característico, o personagem é um sujeito não politizado, que acaba entrando sem querer naquela conspiração e se vê envolvido até o pescoço – mais por um respeito meio fúnebre pelo seu antecessor, talvez. Acompanhamos toda a trama sob a ótica do escritor e, portanto, McGregor praticamente carrega o filme sozinho, com algumas pequenas intervenções bem vindas de um elenco cheio de talentosos nomes como Kim Cattral, Tom Wilkinson, Jim Belushi e o veterano Eli Wallach.

Pierce Brosnan e Olivia Williams ganham maior tempo para desenvolver seus personagens. O ex-007 coloca a carapuça de Tony Blair para interpretar o meticuloso ex-primeiro-ministro Adam Lang. A escolha por Blair não é aleatória. O personagem escrito por Robert Harris é uma versão bastante próxima do político, visto que Harris trabalhou durante muito tempo como colunista político e observou de perto as ações de Tony Blair no poder. Portanto, todas as semelhanças com a fama de galã e a forma estreita com que Adam Lang trabalha com o governo norte-americano não são coincidências criadas na ficção. São agulhadas legítimas de Harris em cima do trabalho do político britânico. Se Brosnan se escora em Blair, Olivia Williams é feliz em imprimir muita inteligência e sarcasmo em sua personagem – uma mulher que serviu durante muito tempo como conselheira para o marido, mas que vem perdendo seu posto com o passar do tempo.

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O único problema aparente de O Escritor Fantasma é tentar convencer o espectador de que a trama se passa nos Estados Unidos. A fotografia é completamente européia. Mesmo com o esmero da direção de arte em tentar camuflar a Alemanha como a terra do Tio Sam, a fotografia peculiar da Europa não deixa dúvidas de que se trata de uma produção filmada no Velho Mundo. Mas este é o único porém deste suspense inteligente, envolvente e com reviravoltas interessantíssimas que deram a Roman Polanski o merecido Urso de Prata de Melhor Diretor no Festival de Berlim 2010. É de bater palmas no final.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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